domingo, 4 de janeiro de 2009

2- THE LIVING THEATRE - SÉRIE TRUPES ANARQUISTAS





























The Living Theatre
Escrito por Rodrigo de Araujo

O grupo teatral “The Living Theatre” foi fundado em Nova Iorque em 1947 pelo ator e pintor expressionista Julian Beck e a atriz Judith Malina. O grupo estudou, concebeu e difundiu uma nova forma de se fazer teatro, ou melhor de vivê-lo.
Durante sua trajetória, foram encenadas mais de oitenta peças em oito idiomas nos quatro cantos do mundo, somando ao todo 25 países participados.
O que o grupo fez foi aliar o encorpado teatro político de Brecht e de Piscator ao seus anseios de transformação social, criando uma forma de teatro radical, pertencente à contracultura sessentista americana. Devido a isto, foram muito criticados por dramaturgos e teatrólogos de renome. Um de seus maiores críticos foi o grande diretor polonês Grotowski.
O termo happening surgiu pela crítica para definir o que acontecia com o novo teatro americano.
Na “Black Mountain College” na Carolina do Norte em 1952, o Living mostrava o poder vanguardista de suas criações, fazendo uma das primeiras apresentações intermídias da história. Uma mistura de projeção de película com sinais luminosos e sonoros e olfativos invadia o lugar, causando espanto e admiração.

Julian Beck
A proposta do Living era a de inserir a platéia de forma inevitável e profunda em suas apresentações, negando as formas convencionais de uma dramaturgia aristotélica, roteirística.
Diversas locações onde mantinham estúdios para ensaios e estudos teatrais foram interditadas com algum pretexto pelo governo americano. Desta forma, o teatro do Living não era apenas “OFF-BROADWAY”, era inteiramente “OFF-OFF-BROADWAY” e nem por isso deixou de repercutir, causar polêmica e de simplesmente, revolucionar o novo teatro americano e mundial.
Criticavam com veemência a Guerra do Vietnã e o “American Way of Life”.
Os principais trabalhos deste período foram “THE CONNECTION”, espetáculo sobre a juventude americana perdida, a fuga nas drogas. Para ilustrar a angústia de um jovem personagem (Gelber) construiram um cenário interessante, como diz Julian Beck em seu diário:
“era pintado de preto, com feixes de listas que se aproximavam passo a passo, convergindo em direção à cena como direto para um foyer, como se nos encontrássemos dentro de uma velha máquina fotográfica Kodak e olhássemos em direção ao exterior através da lente, o olho do sonhador dentro do quarto preto; as cadeiras eram pintadas de cinza escuro, azul, bege, areia e sobre elas grandes números, como se vêem nos circos, com cores brilhantes.”
Em dezembro de 1961 iniciam as apresentações de “THE APPLE”. Neste espetáculo eles utilizam duas obras Brechtianas: “Um homem é um homem” e “Na selva da Cidade”, porém repletas de improvisações, participando o público. Assim como o primeiro, a peça visa criticar a manipulação do indivíduo pelo sistema em que vive.

Judith Malina
Em maio de 1963, quando o grupo nem imaginaria o que estaria por vir em exatos oito anos mais tarde, deram início aos trabalhos de “THE BRIG” (A Prisão).
A estética nos palcos já não era mais a mesma quando iniciaram este espetáculo. Trata-se da história de Kenneth H. Brown, ex-marinheiro dos Estados Unidos que se tornou anárquico. Faziam peças barulhentas, silenciosas, arrastadas ou elípticas, mas sempre com o viés político. Neste caso, a difícil vida dos marinheiros americanos e daqueles presos navais é retratada através de um cenário labiríntico, que adianta ou impede os atores de progredirem suas performances. Arames farpados enrolados são dispostos no palco de forma que os próprios atores se complicam, além de contribuírem para a divisão antagônica entre os atores (presos) e o público (livre).
De fato estavam presos e tiveram de sair da América. Não haviam pago taxas e até mesmo algumas parcelas de público não compreendiam exatamente tamanha “loucura”. Sendo assim, foram para a Europa, onde já haviam estado em 1961, e por quatro anos, de 1964 a 1968 permaneceram criando espetáculos importantes como “FRANKENSTEIN” (1965) e “PARADISE NOW” (1968) apresentado no Festival de Avignon, sendo mais tarde executado em outras partes do mundo.
Frankstein trata do contraste entre rico e pobre, sociedade justa e injusta, igualitária e autoritária, sendo uma de suas criações mais livres em questões de improviso. Já em maio de 1968, o Living chuta o pau da barraca com Paradise Now. Pretendem com isso buscar uma nova sociedade e novos padrões estéticos.
A maneira de se fazer isto, segundo Julian era através da “utilização de alucinógenos, prática de yoga e meditação, liberação dos impulsos eróticos. A própria estrutura do evento, de vaga matriz mágico-religiosa, serve para operar o encantamento, imprimindo ao espetáculo um ritmo crescente: Rito/Visão/Ação, um ciclo que se repete oito vezes, tantas quantos são os degraus da prodigiosa escada pela qual se ascende ao jardim do Éden.”
Já eram conhecidíssimos e responsáveis pela transformação do novo teatro. Em 1970 quando estavam na Alemanha deram uma pausa e vieram para o Brasil a convite do aclamado Diretor de Teatro Zé Celso.
No Brasil, participaram de apresentações com Gerald Thomas e o lendário Grupo Oficina.
O grupo veio para Minas Gerais, onde realizou belos trabalhos junto às comunidades carentes, como na cidade de Ribeirão das Neves.
Tornaram-se amigos do cineasta Glauber Rocha, que também fazia um cinema político e ultra improvisado, também de certa forma, inspirado por Brecht. Já em Ouro Preto, um ano mais tarde, tornaram-se capa do New York Times, chamando a atenção da comunidade artística internacional para o que ocorrera no Brasil.
Sobre este episódio, foi realizado um curta metragem chamado “Paradise Now”, produzido coletivamente e coordenado pelo cineasta Luiz Carlos Lacerda durante a Terceira Mostra de Cinema de Ouro Preto.
Este documentário trata da trajetória do Living em Minas Gerais, especificamente sobre sua estadia na cidade de Ouro Preto - MG. Tive a alegria de trabalhar na Pesquisa, Roteiro e Assistência de Produção do resgate desta história. O curta foi exibido no Cine Vila Rica na cerimônia de encerramento da Mostra.
Julian Beck faleceu 1985.
Hanon Reznikov assumiu a Direção Teatral e casou-se com Judith Malina, ainda viva e em atividade.
O Living é o grupo teatral mais antigo em produção dos Estados Unidos. Sua peça atual é Eureka! baseada em uma obra de Edgar Alan Poe, está sendo executada em um teatro intimista com capacidade para apenas 50 pessoas.

O website oficial do Living é:

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